Ricardo Reis

 

Ricardo Reis, heterónimo de Fernando Pessoa é o poeta epicurista, que aceita, com calma, a relatividade e a fugacidade das coisas.

A filosofia de vida de Reis é a de um epicurismo triste, pois defende o prazer do momento, o carpem diem, como caminho de felicidade, mas sem ceder aos impulsos dos instintos.

Apesar deste prazer que procura e da felicidade que deseja alcançar, considera que nunca se consegue a verdadeira calma e tranquilidade, ou seja, a ataraxia. Sente que tem de viver em conformidade com as leis do destino, indiferente à dor e ao desprazer, numa verdadeira ilusão da felicidade.

 

 

Reis e Caeiro- Comparação

Ricardo Reis, tal como Fernando Pessoa, são ambos discípulos de Alberto Caeiro.

Caeiro, poeta das sensações, recusa o pensamento, afirmando que “pensar é estar doente dos olhos”. Este dá grande importância à Natureza e procura ver as coisas como elas são.

Em Ricardo Reis, próximo de Caeiro, há na sua poesia a aurea mediocritas, o sossego do campo e o fascínio pela natureza onde busca a felicidade.

Reis procura alcançar a quietude e a perfeição dos deuses, desenhando um novo mundo à sua medida, que se encontra por detrás das aparências.

Por conclusão, estes heterónimos têm pensamentos diferentes apesar de terem alguns aspectos em comum. 

 

 

Poema " Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio"

Vem sentar-te comigo Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
    (Enlacemos as mãos.)

Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
    Mais longe que os deuses.

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
    E sem desassossegos grandes.

Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimento demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
    E sempre iria ter ao mar.

Amemo-nos tranquilamente, pensando que podíamos,
Se quiséssemos, trocar beijos e abraços e carícias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
    Ouvindo correr o rio e vendo-o.

Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, e que o seu perfume suavize o momento -
Este momento em que sossegadamente não cremos em nada,
    Pagãos inocentes da decadência.

Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-ás de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
    Nem fomos mais do que crianças.

E se antes do que eu levares o o bolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim - à beira-rio,
    Pagã triste e com flores no regaço.